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sábado, julho 16, 2005

PECADO CAPITAL
Meu blog anterior era repleto de críticas à Carta Capital; não fosse a preguiça inerente ao início de férias, seqüência natural e ansiada de um fim de semestre desgastante, poria-me a fazer um levantamento de quantas vezes critiquei matérias da revista naquele hoje inexistente espaço. Isso era devido a duas coisas: primeiro, era ainda leitor da revista; segundo, já há muito a abominava. Considerava então a publicação como algo a ser criticado, um inimigo a ser combatido; por demais influenciado- e firmemente crente- de que apenas uma guerra cultural evitaria o crescente de esquerdismo no país, via-me como um solitário cavaleiro em um bunker abandonado; a partir daí descobria que muitos outros havia, e a blogosfera liberal e conservadora se revelou de súbito, link por link de uma extensa rede de cavaleiros não tão solitários. O resto é história, e aqui não cabe; quem acompanhou a trajetória daquele e desse blog acompanhou também minha trajetória pessoal e, a isso combinado, o abandono das críticas à Carta; isso se deveu a princípio por questão das mais mundanas - via-me a gastar dinheiro demais por pouca coisa; mas logo fui motivado, ou desmotivado, por algo maior: a revista foi se tornando tão esdrúxula que já não mais acreditava ser capaz de convencer um leitor dela a abandoná-la, desde sempre meu norte, e com isso abandonar também as ideologias fáceis que a publicação vende. Aquele que lê Carta Capital, como os burgueses do texto abaixo, paga para expiar seus pecados e fugir daquilo que é; rejubila-se em ver a elite criticada, enquanto finge não fazer parte da mesma elite – ou pensa compor um substrato dessa, “consciente”, logo esquerdista.
Mas agora não posso me furtar a voltar à carga aqui; a revista, sob a batuta de seu editor, transcende todos os padrões do absurdo em suas análises do governo Lula. Se isso sempre esteve patente - e, repito, não esteve apenas para os leitores que não quiseram ver - atingiu sem dúvida as raias do delírio nessa edição que nas bancas se encontra. É a isso que vou me deter aqui, pedindo aos leitores espaço apenas para uma pequena introdução, reveladora da própria natureza da revista – posto que reveladora, também, da natureza de seu mais distinto membro.
Mino Carta, senhores, é um poço de orgulho. Não falo isso por conhecê-lo profundamente; meu carma não parece ser assim tão significativo. Digo isso por conhecer, aí sim profundamente, seus artigos e a orientação que prega à sua revista. O que impressiona à primeira vista, mesmo ao leitor desavisado, é a impressionante capacidade do senhor Carta de fazer inimizades. Inimigos, é fato, faz-se aos montes - principalmente quando se é um jornalista de palavras tão ríspidas e opiniões extremadas. O fato é que senhor Carta confere novo sentido ao exposto: não são suas opiniões ríspidas que naturalmente amealham inimigos ao seu extenso rol; são, sim, tais opiniões ríspidas cunhadas exatamente para pruduzir tais inimigos. São um meio, não um fim; e meio para que? Se há algo aprazível para um escriba, para um polemista, é exatamente colocar-se na posição de cavaleiro solitário que, como dito acima, em mesmo me pus durante certo período. Tal posição confere a seu portador dois charmosíssimos aspectos ao pretenso intelectual: o aspecto romântico de um Quixote, a lutar contra todos, confere a benevolência natural daqueles que se identificam com os oprimidos; isso é reforçado no caso de Carta pois esses “todos” compõem a “elite”, que “emperra o país”- os leitores, membros dessa mesma elite, excluem-se momentaneamente e expiam seus pecados pela solidariedade. Segundo aspecto: permite a seu autor conseguir crédito para toda sorte de teorias conspiratórias que vitimem a ele, aos seus e a suas idéias; minoritários que são, ficam à mercê dos malvados que controlam capital, poder, mídia. Aqui se irmanam, espetacularmente, Carta e Olavo, o de Carvalho. Ambos são perseguidos, não encontram espaços e são atacados por serem vítimas - um, da “mídia e das elites de direita”; outro, da “mídia e das elites de esquerda”; um é escorraçado da Isto É em conspiração na qual apenas a CIA não esteve envolvida; o outro é demitido de O GLOBO porque o jornal é comprometido com o Foro de São Paulo. Orgulho, ah, o orgulho! Senhores como eles não podem ser demitidos por nada mais que uma conspiração de seus pérfidos inimigos.
Mas voltemos à Carta, apenas. O orgulho de Mino e a quixotesca posição em que estrategicamente se coloca foram adicionados quando das campanhas eleitorais de 2002 por um aspecto interessante: o messianismo. Tomo emprestado expressão do genial Reinaldo Azevedo, o maior intérprete da era Lula: Mino encontrou o seu Tirano, e o comprou com prazer difícil de ser descrito. Editoriais o saudavam, matérias imensas foram a ele concedidas, a república parecia prestes a ser refundada; as elites, aquelas velhas inimigas eternas de Mino, pareciam sofrer um duro golpe - e se podia sentir o riso de Mino, orgulhoso, como que a dizer “eu tenho parte nisso aí, é minha cria também!”. Pois Lula chegou, e a república, como sabia qualquer um que lê Reinaldo - e, porque não, Olavo e os dele - não veio junto. Pelo contrário: veio a tragédia anunciada e na iminência de ser confirmada. Mino parece querer fugir; faz críticas aqui e acolá aos juros, para tentar mostrar suposta “independência” da revista - o esforço é patético, nada mais. A mídia, que antes adorava criticar - sim, pois Mino, o orgulhoso, adorar esculhambar com seus medíocres companheiros de imprensa - consegue furos e mais furos, vai revelando a podridão do Tirano de estimação de nosso amigo, e ele fica ali, quietinho com sua revista, como se tudo se pasasse em dimensão outra, como em episódio de Rod Serling.
Eu não ia comentar nada disso, amigos; estou de férias, tenho coisas aprazíveis para ler, quero conversar com amigos pela rede, ficar sem nada fazer, em merecido ócio. Mas Mino tornou-se impossível com a nova revista. O governo daquele que ele tanto bajulou, defendeu, endeusou, cai de podre, na frente de todos; não há mais nada a fazer que esperar a queda inevitável, senão do Molusco, senão do petismo, pelo menos do messianismo de outrora. Mino poderia, pelo menos, ter ficado quieto; eu ficaria também, provavelmente. Mas decidiu partir para o ataque, um contra-ataque, com a fúria de animal acuado - e tão insano quanto. Ataca quem, o senhor Mino? As elites, é óbvio; ainda não tão insano para explicitar que crê estar sendo Molusco vítima de um complô das elites brancas-heterossexuais-católicas-conservadores-reacionárias-judaico-cristãs-ocidentais – embora se possa ler isso em entrelinhas várias-, Mino decide atacar o ponto mais fraco, e mais simples: a Daslu. Como os estudantes que fizeram dia desses manifestação em frente à loja- pedindo universidade para a qual não tiveram mérito de passar e regados à iogurte, citando novamente Reinaldo-, Mino coloca a Daslu como um símbolo: das elites, das elites malditas!
Longe de mim querer defender a Daslu; como se sabe, a loja, sem pudor algum, conseguiu um aprazível empréstimo do BNDES, o que não parece ter motivado maiores críticas de nossos esquerdistas- pois fazê-lo seria abrir caminho para a profunda crítica liberal que mostra o absurdo que é o próprio banco. Mino preferiu deixar passar, e atacá-la no momento do escândalo. Pode ser culpada, a moça, e ainda outros? Podem todos, acho até provável que sejam, pelas contradições e fatos que tenho visto. Não serei eu que defenderei empresário que se põe sob as asas do Estado fiscalista e interventor; aceitou as regras do jogo, que pague o que deve, na justiça inclusive. Mas o tragicômico é o comportamento de Mino: ele simplesmente comprou o que era desejado pelo senhor Bastos - assim como o exótico ministro tentou desviar o foco da atenção do povo com sua espalhafatosa ação, também Mino tenta fazê-lo com seus leitores. Não se pode negar algo a ele: a fidelidade canina a Molusco e seu projeto de poder; a casa cai, mas Mino continua tentando sustentá-la - ou pelo menos tentando fazer os moradores olharem para outro lado.
Um último apelo a possíveis leitores da Carta Capital que estejam a ler isso: senhores, a Daslu é peixe pequeno. Não é essa a elite que se deve combater; essa elite, desses empresários fraudadores, só existe graças a uma coisa, a um instrumento: ao Estado brasileiro. Ao Estado que está, ele sim, sendo aparelhado absurdamente por uma nova elite- mais uma vez, Reinaldo!-, os “burgueses sem capital”, que agora, aliás, não se mostram tão sem capital assim. O inimigo, senhores, é o PT- ou o PSDB, ou o PFL, ou qualquer um que mantenha as coisas como estão. Como costumam dizer os esquerdistas quando as forças policiais matam um jovem traficante na favela: o combate à Daslu é apenas um enxugar de gelo. O verdadeiro combate, a verdadeira elite perniciosa, é bem outra. Só é preciso querer enxergar.
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Sobre a crise de Molusco, a indicação óbvia e que permeia todo o texto: nada de Carta Capital, um pouco de Mídia sem Máscara; mas quem diz tudo é nossa querida Prilei, a melhor jornalista do país.

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Um pouco de beleza, nesses tempos sombrios: novo single de Los Hermanos.

Felipe Svaluto Paúl(vou-me embora para Itália)

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