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sábado, fevereiro 05, 2005

NÃO AO CARNAVAL
Não, não pretendo aqui qualquer reflexão de ordem moral sobre a impertinência das folias momescas. Ainda que de fato não me agrade certa degradação típica desses festejos não me considero de forma alguma um moralista, capaz de ditar regras de conduta capazes de nos trazer melhora civilizacional- muito menos creio que as moças quase desnudas exemplifiquem um “declínio moral”, algum “vício tipicamente brasileiro” ou mesmo “mais um golpe contra a civilização judaico-cristã”. As moças algo licenciosas nada têm a ver com a corrupção generalizada do país, que também não é de nascimento devasso e só trato de “civilização judaico-cristã” quando um dos cordeiros-colunistas que tanto a evocam conseguirem definir minimamente o conceito.
Também não pretendo realizar a crítica padrão dos tempos atuais, não por acaso esquerdista e anti-capitalista, de que o carnaval “se mercantilizou”, perdendo o “espírito popular”. A primeira acusação é uma constatação e com alegria a saúdo; a segunda é uma bobagem sem a menor base para qualquer um que acompanhe minimamente o noticiário das semanas que precedem o carnaval- as comunidades continuam participando da festa com tanto entusiasmo, alegria e dedicação quanto nos tempos de pobreza, precariedade e limitações da “não mercantilização”.
Então que crítica pretendo fazer ao carnaval? Uma crítica progressista, distante tanto de um moralismo religioso- plenamente válido quando sadio, diga-se de passagem- quanto de um anti-capitalismo simplório. Critico aqui o grande absurdo do carnaval, mais ainda uma vez que ou passa despercebido ou chega a ser saudado: as relações entre o Estado e as folias.
Começo pelo caso menos grave posto que em tese segue de acordo com a lei, por mais nefanda que essa seja. Sabe-se que além do tradicional carnaval carioca os outros grandes beneficiários da festa são os estados nordestinos, favorecidos pelo clima adequado e superabundância de pretensos artistas dispostos a saltitar e entoar bobagens mil. Ocorresse tudo dentro de esfera particular e com os comedimentos que o respeito pelo outro pedem nada haveria que reclamar; porém além do aparente não cumprimento desse segundo e cívico ponto há ainda o mais grave não cumprimento do primeiro: o Estado não apenas auxilia mas é peça preponderante nas folias, com dinheiro do contribuinte sendo colocado na organização e preparação dos festejos. Assim o colega blogueiro André de Oliveira, católico tradicionalista de Salvador, se vê obrigado a financiar a devassidão alheia com os frutos de seu trabalho. Mas Felipe, as festividades atraem turistas, rendem muito mais para o Estado!, diz o leitor revoltado. Verdade e em nada altera o que coloquei, precisando apenas acrescer pontos para dar maior clareza à questão: a) sr. André de Oliveira não é banco, muito menos banco compulsório; caso o Estado sinta interesse em usar do dinheiro dele para patrocinar algo e creia que o retorno para o próprio André será maior que solicite a verba a ele e não a tome sob pena de prisão caso o espoliado se negue a entregá-la; b) salvo raras ou mesmo inexistentes exceções lusas o leitor desse blog é brasileiro, e bem sabe que o dinheiro auferido pelo Estado terá destino que dificilmente reverterá em benefício de André, que salvo engano não integra as minorias de ocasião que possam se beneficiar- em tese- de populismos em voga; c) ética, há uma questão ética que transcende a econômica; mesmo que André fosse convencido pelo Estado de que o dinheiro por ele emprestado reverteria em benefícios para o próprio poderia simplesmente se negar a emprestá-lo, posto que financiaria práticas morais que ele condena. Ou seja: tal como se dá hoje o sr.André de Oliveira financiará a título compulsório- repito, sendo passível de prisão caso não pague os tributos devidos- práticas morais que condena sem ter em vista benefício prático algum disso. E isso sem grita alguma de nossa inteligentsia esquerdista, a mesma que ainda se vê por aí bradando contra César Maia por ter ele deixado de distribuir pílulas abortivas com o dinheiro do contribuinte anti-aborto, revoltando-se nossos intelectuais contra os “fundamentalistas católicos”- os mesmos que financiam através do impostos compulsórios não só o carnaval como a própria sobrevivência aprazível desses intelectuais.
Fecho com o que penso ser o exemplo mais terrível dessas relações promíscuas entre Estado e carnaval com o exemplo de minha cidade, o Rio de Janeiro. Nela se dá o maior carnaval do mundo, transmitido globo afora e adorado pelos turistas mil que enchem a Zona Sul da cidade nesse período; é uma das grandes bandeiras de exportação de uma pretensa “cultura brasileira”. Pois bem, digo aqui o óbvio e solenemente ignorado por nossas autoridades, talvez mesmo pelos moradores de estados outros do país: o carnaval carioca é a festa do crime. Repetindo, a festa do crime. A associação entre escolas de samba e bicheiros eufemisticamente designados na pior das hipóteses como “contraventores” chega a ser folclórica, estando inclusive presente em atual novela global. Mas por detrás da imagem bonachona do personagem novelístico e das mitologias várias, a verdade é uma só: o jogo do bicho está longe de ser apenas diversão inocente de aposentados e pobres, sendo na verdade cúmplice fortíssimo do tráfico de drogas, havendo inclusive quem diga ser o jogo já há muito um negócio apenas residual dos bicheiros. Pois são exatamente esses bicheiros associados com o tráfico que os leitores vêem perambular prosaicamente no Sanbódromo durante os desfiles, são eles que freqüentam colunas sociais e programas de tevê, serão diversos deles que se farão presentes na apuração dos votos tradicional de Quarta-feira de Cinzas...e o pior: são eles que podem ser vistos em apertos de mão e abraços cúmplices com as autoridades governamentais, aquelas pagas pelos leitores exatamente para mostrar algemadas as mãos que afagam. Tudo isso sob o silêncio amigo da nossa mídia escrita e falada, da intelectualidade esquerdista já citada e de uma vergonhosa elite econômica, que aqui no Rio beira a tragicomédia glorificada no fenômeno da estupidez e alienação emergentes da Barra da Tijuca.
Fica então o pedido: cidadão de bem no Brasil deve dizer não ao carnaval que aí está, ao carnaval da exploração do contribuinte e da associação explícita e celebrada entre Estado e criminalidade.
Felipe Svaluto Paúl(doente do pé)



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